Não é fortuitamente que a exposição “Licença para afirmar” inaugura no dia 1 de Abril de 2010. Há dias agendados para celebrar ou recordar o quer que seja, parece ser característica inerente à cultura humana o agendamento do tempo com dedicações simbólicas, para que o passado nos faça sentido narrativamente.
Sem qualquer causa aparentemente indubitável é atribuído ao dia 1 de Abril, no calendário anual gregoriano, uma espécie de dia de excepção; neste dia é permitida, sem punição do proclamador, a possibilidade de pôr de parte quaisquer valores éticos e comportamentais subjugados à ideia de verdade e à correspondência das afirmações aos factos da realidade empírica, e assim deflagrar mentiras como verdades, e ou vice-versa.
É este dia de exclusividade que motiva a concepção desta exposição e, fazer da mesma data, pretexto para que cada artista pense as suas propostas com a consciência de que o espectador recebe o seu trabalho, num período em que a confusão se pode instalar, sem equívocos. Sem equívocos porque, ao contrario de todos os outros dias, questionar constantemente aquilo que nos é afirmado, sob modelos de verdade, passa a ser irrelevante, pois neste prazo de exclusividade qualquer tentativa de apurar a veracidade das afirmações cai sobre terra, visto que o dia é dedicado à baralhada – tudo é possível dizer e desdizer – para que, de alguma maneira, se mantenham as regras todos os outros dias do ano.
Fica assim aberto, sub-repticiamente um estado de catástrofe da credulidade, todas as afirmações ao longo deste dia (em muitos países apenas até ao meio-dia, a partir daí o enganador passa a ser considerado um “April fool” – “tolo de Abril”) são susceptíveis de constante desconfiança. Todos aqueles que recordam o significado da data encaram os depoimentos dos fenómenos ao longo do dia com ambiguidade, mecanismos de atenção e constante questionamento são accionados para o insólito.